"A minha pátria é a língua portuguesa"

Sunday, October 29, 2006

As Comadres

Se eu, por um capricho qualquer, fizesse um inquérito às pessoas da minha santa terrinha acerca dos seus hobbies preferidos, 90% (e estou a avaliar por baixo) responderia “Coscuvilhar”. Falar da vida alheia, difamar, cortar na casaca, desenterrar mortos e enterrar vivos. E é essa triste certeza que me faz às vezes desejar ir viver para um sítio onde ninguém me conheça ou construir uma casa no meio dos montes, bem longe de vizinhos.
Revolta-me saber de mexericos, com maioria de razão quando envolvem a minha pessoa ou familiares e amigos. Mas quando racionalizo a questão, transformo a revolta em pena. Cansa menos. Pena porque os “disse que disse” partem de pessoas que não têm vida suficientemente interessante para se absorverem nela e portanto apimentam pormenores da vida alheia ou, mais repugnante ainda, inventam.
Nojento é também aquilo que sucedeu a Miguel Sousa Tavares. A essência e o objectivo são similares com a agravante de usar meios diferentes e ter maior repercussão. Explicitando: há um blogue (freedomtocopy) que acusa o referido escritor de plágio na sua obra Equador relativamente ao livro Esta Noite a Liberdade, de Dominique Lapierre e Larry Collins. A acusação não tem fundamento algum, como já foi comprovado. Miguel Sousa Tavares, como é natural e compreensível, sente-se ultrajado, afirmando: “A calúnia causou danos. Em meia hora consegue-se sujar um nome e o mérito de um trabalho de anos.” E como o blogue não vem assinado, os autores são meros fantasmas.
Na verdade, é difícil imaginar as comadres da minha terrinha a navegar na bloguesfera e a publicar mexericos. Mas a inveja, a mesquinhez ou o simples gozo de difamar são os mesmos. E é um cenário não muito distante porque com o avançar das gerações as novas tecnologias são prática comum.
Portanto, aqui fica o apelo: não usem a bloguesfera para as vossas frustrações mas sim como um espaço de diálogo edificante, troca saudável de opiniões. Nunca como meio para enxovalhar e denegrir a imagem do próximo. E principalmente, sem a cobardia do anonimato.

Friday, October 27, 2006

Saltar da Cama

Convenhamos, ter de acordar cedo para ir trabalhar nunca é agradável. Se ainda por cima é segunda feira, está a chover e está frio, então a coisa complica-se mesmo. Os “só mais cinco minutos” transformam-se em quinze, ficamos com pouco tempo para tomar o pequeno-almoço e demais actividades rotineiras, o caos instala-se. Portanto, é legítimo afirmar que despertar nessas condições é traumático.
Ora, um estudo realizado no Reino Unido, demonstra que as mulheres permanecem mais mal-humoradas nas 4 horas seguintes a acordar (30%) comparativamente aos homens (10%).
Deixemos a questão sexista, até porque não é favorável à minha pessoa. A que se deve um “mau-acordar”? Esse mesmo estudo demonstra que 40% dos inquiridos justifica o mau-acordar devido a noites mal dormidas enquanto 24% culpa o stress e as preocupações.
Bom, eu normalmente durmo como um anjo. Só situações muito, muito pontuais me tiram o sono. E contudo, não tenho um acordar fácil.
Pessoalmente acho que a boa disposição depende em parte do modo como somos acordados. A mim, já me despertaram arrancando literalmente os cobertores de cima ou então quase a arrombar a porta do quarto. Simpático, não é? Também não ajuda nada quando é o despertador com apitos histéricos que me fazem acordar sobressaltada. É um exagero dizer que me estragam o dia, mas não é um começo muito auspicioso.
Felizmente já encontrei duas soluções: uma depende de terceiros e outra depende de boa música. Explicitando: quando é a minha mãe a acordar-me com jeitinho, com festinhas no cabelo e com uma chávena de café quentinho, então a manhã corre lindamente. Quando a mamã não pode estar ao serviço, então socorro-me de boa música com muita energia.
Tenho a teoria que a música que ouvimos de manhã nos acompanha durante o dia. Já me aconteceu ouvir nos autocarros, géneros musicais que roçam o pimba e depois ficar a trautear a música o dia inteiro. Irritante, no mínimo. Portanto, o que faço é ouvir algo alegre, bem disposto e de boa qualidade. E muitas vezes em português, para ir mais facilmente acompanhando a letra.
Resultado? Um sorriso pouco justificável a horas tão matutinas, menos sonolência nas aulas e mais coragem para enfrentar o dia.

Sunday, October 15, 2006

Os Grandes Portugueses

Começou hoje com uma nota introdutória, mas o novo programa da RTP já dá que falar. Para os que ainda não sabem, trata-se de um programa de entretenimento e debate a partir da votação dos portugueses relativamente à figura mais marcante da nossa história. Qualquer pessoa pode ser nomeada, mas a RTP já disponibilizou uma lista para dar dicas e refrescar certas memórias enferrujadas, como a de uma senhora entrevistada que disse: “Para mim, é aquele senhor escritor que vive em Espanha… não me lembro o nome…”
Relativamente à lista que a RTP disponibilizou, de início não constava o nome de Salazar. Levantaram-se logo as vozes discordantes e acusadoras de “censura histórica”, esquecendo-se que a lista apresenta sugestões e não as opções obrigatórias de escolha. Uma rápida leitura da lista mostra que não são nomeados todos os políticos relevantes (por bons e maus motivos) da nossa história. Posteriormente, lá foi incluído o dito cujo. Sobre isso, concordo inteiramente com o Professor Marcelo Rebelo de Sousa quando disse hoje nas suas “Escolhas” que a diferença entre a democracia e a ditadura, é que a ditadura não permite a censura a si mesma enquanto a democracia permite a crítica a essa mesma democracia.
Na verdade acho que me estou a alongar demasiado, visto que não foi este o objectivo principal que me levou a escrever o presente texto. Durante o tal prelúdio ao programa em questão, diversas pessoas foram entrevistadas e convidadas a dar a sua opinião. Uma jovem (entre os 15 a 17 anos) respondeu convictamente: “Cristiano Ronaldo!” Reconhecendo a sua total liberdade e validade de opinião, não posso deixar de dizer que achei deprimente. Até pode ser que tenha dito o primeiro nome que lhe veio à cabeça, mas é triste que a primeira coisa que venha à cabeça de uma pessoa, quando questionada sobre uma personalidade relevante, seja o nome de um puto mimado e com mau feitio, que a única e melhor (?) coisa que faz pelo país é marcar golos.
Ele escreveu algum livro? Se sim, deve ter sido algo como “Porque chorei quando Scolari me substituiu”. Ele é algum político, advogado, economista, cientista de renome? Ele tem obra feita? Ele é escultor, pintor, arquitecto, músico conhecido além-fronteiras? Ele lutou para que Portugal, de alguma forma, melhorasse? Ele enobreceu a língua mãe? Tem algum projecto humanitário?
Penso que este programa vai ser interessante na medida em que vai fazer-nos ver que podemos ser bons, muito bons. Que existem, ou existiram, pessoas das quais nos podemos orgulhar de serem nossas compatriotas. E, espero eu, contribua para o enriquecimento cultural.
A verdade é que vai ser uma escolha árdua. Não defini bem a minha escolha. Fernando Pessoa, Sophia de Mello Breyner, Infante D. Henrique, Mário Soares, Maria João Pires, Eça de Queiroz, Egas Moniz, José Saramago, Zeca Afonso, Salgueiro Maia, entre muitos outros.
Cristiano Ronaldo? Definitivamente, não me parece.

Wednesday, October 11, 2006

Update

Lia-se outro dia no Diário de Notícias que a Igreja vai abolir o Limbo, lugar para onde iam (parece que vão deixar de ir) as almas que, sem terem cometido pecados, morreram sem serem redimidas do pecado original. Por outras palavras, que não foram baptizadas. Nessa categoria inserem-se, por exemplo, as crianças que morreram sem serem baptizadas ou aquelas que viveram antes de Jesus Cristo. Bastante gente, na verdade. Segundo esta teoria, quem se encontrava no Limbo, estava privado da felicidade plena da visão de Deus, mas gozando de uma felicidade natural. Nas palavras do antigo catecismo de São Pio X: “não usufruem da companhia de Deus, mas também não sofrem.” Ora, a Comissão Teológica Internacional, reunida no Vaticano na semana passada, pretende abolir o Limbo, que nunca chegou a ser uma verdade de fé, mas pretendia frisar a importância do baptismo para evitar o Inferno. A batida técnica da persuasão pelo medo.
Agora das duas uma: São Pedro comunicou com a Comissão Teológica Internacional a dizer que o sistema Limbo estava saturado e portanto havia necessidade de promover alguém para os muitos lugares vagos dos eleitos de Deus.
Ou então alguém leu a Bíblia com mais atenção e tropeçou na inequívoca frase “Deixai vir a mim as criancinhas” e pôs-se a pensar se fazia algum sentido uma criança, que não teve tempo sequer de desobedecer aos pais, ser marcada pelo pecado original da mítica e inesquecível tentação de uma maçã.