"A minha pátria é a língua portuguesa"

Friday, September 29, 2006

Segredos de um Sorriso

É considerado o retrato mais famoso da história da arte e até o quadro mais conhecido do mundo. Refiro-me, como é evidente, à Mona Lisa ou Gioconda (como preferirem). Com um poder de sedução que se assemelha, em fotografia, com os olhos penetrantes de Sharbat Gula (a conhecida capa da National Geographic), a mulher apresenta um (meio) sorriso que prende o olhar.
É esse sorriso que intriga e continuará a intrigar gerações, levando à especulação e construção de várias teorias. Pensa-se que a mulher representada era Lisa Gherardini, a esposa de um comerciante florentino de sedas, Francesco del Giocondoque. Há quem sugira também que é Isabel de Aragão, Duquesa de Milão, para quem da Vinci trabalhou 11 anos. Recentemente, graças ao Código da Vinci, tem-se expandido a teoria de que a Gioconda não é mais do que o próprio artista vestido de mulher. Sobre essa última teoria li a seguinte citação de Barnett Newman (1992): “ Aqueles que põem um bigode na Mona Lisa, não a atacam a ela nem à arte, atacam o homem. Leonardo da Vinci. O que os irrita, é que com meia dúzia de pinturas ele tenha conquistado um lugar ímpar na história da arte, enquanto que eles, apesar da extensão da sua obra, têm dúvidas.”
Quanto ao sorriso em si, Freud interpretou-o como a atracão erótica que da Vinci sentia pela mãe. Típico, ou não estaria a falar de Freud. Um algoritmo de computador, desenvolvido na Holanda, descreve o sorriso como sendo de uma mulher 83% feliz, 9% enjoada, 6% atemorizada e 2% incomodada.
Recentemente, o perito francês Bruno Mottin veio a público defender que a Mona Lisa sorri porque tinha sido mãe recentemente. Isto baseado em análises ao quadro que revelaram a existência de um véu que era usado em Itália no século XVI por uma mulher grávida ou que acabara de dar à luz.
A verdade é que muitos estudos voltarão a ser feitos, muitas perguntas formuladas à tímida e quase trocista Mona Lisa. Mas o segredo, se de facto existe algum, permanecerá no silêncio do autor e do modelo. E é precisamente aí que reside o fascínio deste quadro em particular e da arte (sob as suas mais variadas manifestações) em geral. O facto de nunca se ter a certeza do que o autor pretendia. O facto de a arte não ser apenas obra do autor, acabada, completa, finita, mas sim uma incógnita, uma permanente construção do público que o interpreta. Uma base física onde o público projecta a sua vida, as suas emoções, a sua noção de estética, em suma, a sua interpretação.
Para mim, a Mona Lisa tem um sorriso doce, plácido, condescendente e amoroso. E porque sorri? Não sei. Eu também sorrio muitas vezes sem saber muito bem porque o faço.

Wednesday, September 20, 2006

A propósito do Gordon

A questão das alterações climatéricas é, hoje em dia, incontornável. Se bem que apocalipticamente e com muitos erros científicos à mistura, o filme “O Dia Depois de Amanhã” teve bastante mérito por chamar a atenção das massas para esta realidade. Os verões tórridos e o aumento dos furacões, por exemplo, não são fruto do acaso. São fruto de anos selvagens em que construímos a nossa sociedade escrava de combustíveis fósseis.
Recentemente li um artigo bastante lúcido e inteligente, de Bill McKibben, ensaísta ambiental, publicada na National Geographic Portugal (do corrente mês), sobre a evolução que o conceito de ambientalismo terá de sofrer. Aqui ficam alguns excertos mais significativos.

“O velho paradigma alega que julgamos quase todas as questões com base na pergunta “Será que isto vai melhorar a economia?” Se a resposta for afirmativa, aceitamos o que quer que esteja em questão. […] Os combustíveis que possibilitaram o nosso crescimento são precisamente os mesmos que ameaçam agora a nossa civilização. Se queimarmos um litro de gás, libertamos mais de meio quilo de carbono para a atmosfera. […]
Tudo isto significa que necessitamos de uma nova ideia. Temos de parar de nos perguntar “Será que isto vai melhorar a economia?” Em vez disso, devemos perguntar-nos “Será que isto vai atirar mais carbono para a atmosfera?” Uma parte da mudança terá de ser tecnológica. Se as emissões de carbono custassem dinheiro aos produtores, construiríamos centrais eólicas muito mais depressa. Todos os carros seriam híbridos e todas as lâmpadas seriam fluorescentes. Todas as novas centrais a carvão teriam de separar o carbono dos gases de exaustão e enterrá-lo no subsolo. […]
Precisaríamos de uma espécie de ambientalismo cultural que levantasse questões mais profundas do que aquelas que estamos habituados a levantar. […] Desde que os investigadores iniciaram as sondagens de contentamento social, nos anos seguintes à Primeira Grande Guerra, a percentagem de americanos que se consideram “muito felizes” com a sua vida mantêm-se igual, ainda que o nível de vida material tenha praticamente triplicado durante o mesmo período. O facto de termos mais coisas não está a fazer-nos mais felizes, mas não conseguimos quebrar o ciclo que nos oferece mais coisas como o nosso único objectivo real. […]
Construímos a sociedade mais hiperindividualizada que o mundo alguma vez viu. […] Isso contribui também para a tal crescente insatisfação e para a nuvem de dióxido de carbono. Se toda a gente for de carro para todo o lado, será difícil reduzir as emissões. […] Imagine uma unidade eólica no fim da rua sem saída onde vive, alimentando as dez casas do bairro. Produziria imensa camaradagem e pouco carbono. […] O ambientalismo tornou-se com frequência um tema desconsolado. Mas um ambientalismo de convívio, que nos obrigasse a descobrir o que realmente queremos da vida oferece profundas possibilidades. […] O ambientalismo não está a morrer. Com efeito, nunca foi tão necessário. Mas terá de se transformar em algo tão diferente que o antigo nome deixará de fazer sentido. Terá de defender um novo tipo de cultura e não um novo tipo de filtro; terá de prestar tanta atenção a oradores como presta a cientistas; terá de se preocupar tanto com a cenoura do mercado dos agricultores como se preocupa com o veado da tundra árctica. É isso que nos dizem as imagens das concentrações atmosféricas de dióxido de carbono e as mensagens repetidas pelos investigadores que estudam a felicidade e a satisfação. Não precisamos de uma versão ligeiramente calibrada do mundo que habitamos agora; temos de começar a realizar mudanças à escala do problema que enfrentamos.”

Friday, September 15, 2006

Habemus polémica

De visita à Alemanha, Bento XVI proferiu terça-feira passada afirmações polémicas que vêm acentuar mais ainda o fosso, que já não é pequeno, existente entre as religiões. Segundo Bento XVI: “para a doutrina muçulmana, Deus é absolutamente transcendente. A Sua vontade, não se encontra ligada a nenhuma das nossas categorias, nem se quer à da razão.”
Pessoalmente não me parece que esta seja a melhor maneira de dar continuidade à política, se é que lhe podemos chamar assim, ecuménica do seu antecessor. Num mundo sulcado por conflitos religiosos, em que um simples cartoon pode levar ao ataque a embaixadas, as afirmações do Sumo Pontífice revelam uma enorme falta de diplomacia, o que já é apanágio do Vaticano.
Por outro lado, enquanto representante máximo de uma religião, Bento XVI não devia apelar muito à razão, dado que nenhuma religião é uma questão racional mas uma questão de fé, e que portanto, está para além da demonstração científica. Ou se acredita ou não. Agora, se o Sumo Pontífice se refere a questões de violência ou intolerância talvez esteja a pisar terreno perigoso ao fazer generalizações. Até porque o catolicismo não é perfeito. Não estou de modo algum a desculpar acções bárbaras ou, por exemplo, a posição da mulher nas sociedades muçulmanas. Simplesmente considero não ser esse o melhor caminho para o diálogo e para a convivência saudável entre as religiões. Pois quem nunca pecou, que atire a primeira pedra.

Tuesday, September 12, 2006

Requiem

Recordo com clareza mesmo passados cinco anos. Não apenas as imagens que pareciam retiradas de uma produção de Hollywood mas também pormenores domésticos. Era um dia um pouco diferente: a minha mãe fazia anos e era o primeiro dia de aulas. No meio da agitação, o meu irmão, impassível, sentou-se no sofá e ligou a TV. E disse: “Um avião bateu no World Trade Center”.
As imagens eram dantescas e os diferentes canais esforçavam-se por passar as imagens mais claras da situação. Desde a imagem em câmara lenta do embate na segunda torre, onde se podia ver o progresso infernal de uma massa de fogo até ao desespero puro de quem se lançava, sem esperança, das torres.
Será talvez um cliché mas tenho de dizê-lo: para mim não foram apenas as torres que caíras. Aquilo que sustentava a segurança do meu mundo ficou também desfeito em pedaços. Com 14 anos, idade em que comecei a alargar horizontes e a interessar-me pela actualidade mundial, já me tinha começado a desiludir com o ser humano, consequência inevitável do crescimento. Aquele acto bárbaro, cruel, de uma violência atroz e gratuita foi a gota final. Ainda me arrepia o desprendimento e o fanatismo daqueles que entregaram a vida (para mim um bem precioso) para semear o medo e derramar sangue inocente. A queda das torres, símbolo da megalomania americana, fez-me ver quão frágil e insegura é a existência. Que a aniquilação pode resultar de um triste acaso numa manhã de trabalho, quando a vida quotidiana se cruza com a malvadez de objectivos sangrentos.
O meu maior medo quando era uma criança pequena era a hipótese de uma guerra que me separasse dos meus pais e virasse a minha vida do avesso. Esse bichinho adormecido despertou na manhã de 11 de Setembro de 2001. Não da forma irracional própria de uma criança, mas com a clareza de uma maturidade cada vez maior, quando, mesmo superficialmente, nos apercebemos dos meandros obscuros da política, da tensão internacional, de guerras movidas por interesses duvidosos e por último da triste descoberta da essência humana.
Ainda outro dia, com a ingenuidade própria de uma menina de 10 anos, a minha irmã comentou que o melhor seria esquecer o 11 de Setembro e não repetir as imagens que marcaram aquele dia. Não compreende que o trauma não passa se não se falar dele. Não compreende que a melhor maneira de homenagear quem morreu é manter as consciências despertas. Um dia, perceberá. Por enquanto consola-me a ideia que ela é feliz por ignorar a verdadeira dimensão das coisas. Inevitavelmente, vai acordar para a realidade. Mas espero que não de forma tão brutal como eu.

Sunday, September 10, 2006

Civismo ao mais alto grau

Imagine que está a dar um agradável passeio pela marginal de Ponta Delgada e, subitamente, sente fome. Apetece-lhe algo barato e pouco saudável, de maneira que opta por um cachorro quente, entre a variedade de oferta deste produto na referida zona. Compra o cachorro, come-o e depois fica com a lata do refrigerante e com o guardanapo de papel na mão. O que faz com eles? Muito civicamente, atira para a plataforma que se está a construir para as Portas do Mar.
De facto, não é preciso pensar muito para perceber que é essa a atitude de muitas pessoas quando por lá se passa e se vê uma enorme quantidade de latas de refrigerantes e uma massa branca de guardanapos de papel. E o mar já lá não chega de modo a camuflar as coisas.
A imagem de tal situação é deveras desagradável e revela uma falta de civismo gritante de quem o faz. Dá, como é compreensível, um terrível aspecto que impressiona tanto micaelenses como os muitos turistas que se passeiam por Ponta Delgada.
Agora pergunto eu: serão os caixotes do lixo invisíveis? Ou será que ficam à distância de 5 metros da pessoa que atira fora o lixo, e portanto exigem uma caminhada muito longa para depositá-los no sítio devido? Estarão todos os caixotes do lixo cheios?
A solução talvez passasse por aumentar o número de caixotes do lixo. Mas a verdadeira solução passaria sim pelo sentido cívico de quem suja e é comodista. É portanto, a meu ver, uma questão de mentalidade que só pode ser combatida com sucesso a partir das gerações mais novas.

Friday, September 08, 2006

América à Mesa

Hoje vamos melhorar a sua vida ensinado um truque de culinária americana: como fazer um (suposto) terrorista falar.

1) Coloque o terrorista numa prisão em sítio indefinido. A melhor maneira de transportá-lo é em voos secretos.
2) Mantenha o terrorista algemado.
3) Se ele se recusar a falar vá seguindo os passos descritos até que se preste a dar informações.
4) Sacuda-o com força.
5) Aplique uma bofetada no rosto do terrorista.
6) Seguidamente, aplique uma pancada na barriga provocando dor temporária mas não lesão interna.
7) Mantenha o terrorista de pé e acordado durante 40 horas.
8) Coloque-o numa sala a 10º Celsius, mantendo-o nu e molhado.
9) Finalmente, aplique o “tapume de água”. Cubra-lhe o rosto com celofane e despeje água. Isso fá-lo-á vomitar.

Estas pequenas dicas foram retiradas de uma reportagem de Brian Ross com a colaboração de ex-agentes da CIA. Segundo os mesmos o tempo record de resistência é de 2 minutos e meio e pertence a Khalid Sheikh Mohammed, suposto cérebro dos atentados de 11 de Setembro.

Se desejar optimizar os resultados, siga os conselhos do galardoado chefe Bush: ele não especifica os métodos usados porque “se o fizesse, ajudaria os terroristas a resistir ao interrogatório.”

Tuesday, September 05, 2006

Freddie

A par das diversas crises que grassam por este mundo fora (políticas, sociais, ambientais...) estou convicta que também se atravessa uma grave crise musical. E tanto é mais forte esta minha opinião por ser uma grande apreciadora e não conceber a vida sem música. Grosso modo, acho que a música que se produz actualmente é fast-food. Algo sem profundidade, que vende rápido e que deixa uma sensação estranha depois de a saborear. É música ouve-e-deita-fora. Aquilo que aparece é repetido até à exaustão na TV, na rádio (veja-se o exemplo de James Blunt que faz umas letras e rimas ridículas) e, em abono da verdade, em altos berros nas aparelhagens dos vizinhos e no carro de muita gente que ainda não se apercebeu do preço da gasolina.
Em comparação com estes pseudo-artistas de momento, existem músicas, compositores e grupos que são eternos. Que não enfastiam. E que não são esquecidos.
Os Queen são um desses exemplos. Se estivesse vivo, hoje Freddie Mercury faria 60 anos. Morreu à 15 anos, vítima do vírus da SIDA.
Apenas há uns anos é que comecei a ouvir e a apreciar Queen. Não obstante o facto de ser a música em voga na época dos meus pais, considero Queen uma das maiores e melhores bandas de sempre. Lembro-me até que uma vez estava na escola a cantar baixinho "I want to break free" (uma das minhas preferidas) e uma colega olhou para mim escandalizada dizendo que a música era velhissíma. É de facto. Mas vale muito mais do que muita da música produzida actualmente. E prova disso, são as comemorações dos 60 anos do emblemático vocalista. Sendo o rosto da banda, Freddie, entre a adoração e a crítica, tinha uma forma muito singular e exuberante de pisar os palcos. Freddie será sempre recordado.
Dizia: "Acho que ser natural e sincero é o que conta." Nada mais verdadeiro.